Comunidades geraiseiras na Bahia obtém decisão judicial contra a Fazenda Estrondo
As comunidades geraiseiras de Cachoeira, Marinheiro, Arroz, Cacimbinha, Gatos, Mutamba e Aldeia, localizadas na zona rural do município de Formosa do Rio Preto, obtiveram decisão liminar favorável em ação de manutenção da posse movida por elas contra as empresas Delfim Crédito Imobiliário S/A, Cia de Melhoramentos do Oeste da Bahia (CMOB) e Colina Paulista, que administram o empreendimento Agronegócio Condomínio do Estrondo.
A ordem foi proferida pela magistrada Marlise Freire Alvarenga, titular da Vara Regional de Conflito Agrário e Meio Ambiente do Oeste da Bahia, sediada em Barreiras, após constatar a gravidade dos fatos narrados na ação e considerar suficiente a farta documentação que comprova a posse tradicional das comunidades há mais de cem anos.
O conflito fundiário entre os geraiseiros e a “Fazenda Estrondo” iniciou-se ainda no final da década de 70 e perdura até os dias atuais. O agora denominado Agronegócio Condomínio Cachoeira do Estrondo foi apontado pelo INCRA, em 1999, como um dos maiores casos de grilagem de terras do país, com 444 mil hectares apropriados pelas empresas por meio de seus prepostos, além de haver denúncias de uso de trabalho análogo à escravidão e inúmeras autuações por crimes ambientais.
As matrículas dos imóveis que compõe o condomínio chegaram a ser bloqueadas no ano de 2014, após recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A maior parte desta área corresponde ao chapadão que margeia o Rio Preto na região próxima da sua nascente, na divisa entre Bahia e Tocantins, na região conhecida como MATOPIBA. Para as comunidades, restaram apenas as áreas do vale que, somadas, alcançam aproximadamente 43 mil hectares. Foi sobre essa área remanescente que foi concedida da manutenção da posse comunitária.
Até mesmo a reserva legal da propriedade foi derrubada para abertura de novas fazendas, o que gerou autuação e multa pelo IBAMA. As empresas, para fugir da multa e ainda se apropriar ilegalmente de novas áreas, tem indicado que a reserva legal do empreendimento seria justamente na área de vale ocupada tradicionalmente pelas comunidades, situação que tem agravado o conflito. Neste sentido, as empresas vêm nos últimos anos abrindo ilegalmente novas picadas, erguendo cercas e construindo estradas e guaritas para controle do acesso de pessoas nas áreas publicamente reconhecidas como de ocupação comunitária, incluindo os povoados e também áreas e uso familiar e individual. As denúncias vão desde agressão, ameaças de morte e até sequestro de lideranças comunitárias promovido por pistoleiros e pela empresa de segurança Estrela Guia, contratada pelo condomínio para viabilizar a apropriação ilegal das terras das comunidades.
A partir do ano de 2012, o Ministério Público Estadual, por meio da Promotoria Regional do Meio Ambiente sediada em Barreiras, abriu Inquérito Civil para apurar as violações ambientais cometidas pelas empresas e, desde então, tem buscado formas consensuais para reparação dos inúmeros danos materiais e ambientais causados, assim como uma solução negociada para garantia da posse tradicional e titulação das terras das famílias. Apesar dos reiterados esforços do MPE, novos ataques continuaram acontecendo ao longo de 2016 e denúncias também já foram feitas em razão de fatos ocorridos em fevereiro deste ano.
Com a decisão liminar favorável, as famílias geraiseiras manifestaram expectativa de que novas agressões não aconteçam e que possam continuar exercendo a agricultura familiar, o extrativismo e a pecuária nas áreas coletivas sem serem molestados por seguranças armados ou pistoleiros. As comunidades estão sendo assessoradas judicialmente pela Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais do Estado da Bahia (AATR) e têm o apoio de diversas outras entidades e organizações da sociedade civil, a exemplo da 10envolvimento, ISPN, da Comissão Pastoral da Terra e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Formosa do Rio Preto. Estas organizações apoiaram ainda a realização do filme documentário “Gerações Geraiseiras” (2017), que retrata as comunidades e o contexto do conflito, e será lançado no FICA – Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, a ser realizado na Cidade de Goiás-GO, entre os dias 20 e 25 de junho de 2017.
Texto das organizações que compõem a Campanha: 10senvolvimento e AATR.
Confira a decisão judicial aqui