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Articulação Agro é Fogo vai à Bélgica para dialogar contra o Acordo UE-Mercosul

Para conscientizar a comunidade internacional sobre as ameaças que o Acordo entre a União Europeia (UE) e Mercosul representam para o Cerrado brasileiro ao aprofundar a devastação da sua sociobiodiversidade, a Articulação Agro é Fogo, junto à Comissão Pastoral da Terra - Regional Goiás (CPT Goiás), participará, a partir do dia 12 de março, de debates e experiências com as comunidades locais durante a Quaresma Compartilhada em Bruxelas, na Bélgica.

Organizado pela Entraide et Fraternité, uma Organização Não-Governamental (ONG) belga de cooperação para o desenvolvimento e solidariedade internacional, que visa reduzir as desigualdades e lutar contra a injustiça social, o evento deste ano traz como tema “Brasil: terra é vida, eles e elas resistem a existir!”.

Ao lado de defensoras e defensores dos direitos humanos e territoriais, Bárbara Dias, da Articulação Agro é Fogo, Maria Moreira, do Acampamento Dom Tomás Balduíno – Goiás, do MST Goiás, e Saulo Reis, da CPT Goiás, vão expor, ao Parlamento Europeu e sociedade Civil, os problemas causados pelo avanço desenfreado do agronegócio e hidronegócio brasileiro, os agrotóxicos que envenenam os recursos de vida e as queimadas criminosas que reforçam o projeto de morte no país.

Além disso, ao longo das várias rodas de conversa previstas até abril, a Articulação Agro é Fogo e a CPT Goiás, também farão uma análise da conjuntura política brasileira dos últimos 4 anos, especialmente no que se refere aos conflitos por terra, aos projetos de mineração e a repressão enfrentada pelas comunidades e povos tradicionais que lutam pela proteção de seus territórios.

Para acompanhar sobre as atividades desse encontro siga as redes da Articulação Agro é Fogo.

Por que falar do Acordo UE-MERCOSUL e a devastação do Cerrado?

Na sessão final do Tribunal Permanente dos Povos em Defesa dos Territórios do Cerrado (TPP), realizada em 2022 e organizada pela Campanha em Defesa do Cerrado, após a avaliação de casos, pesquisas e audiências, o júri também condenou a UE e empresas multinacionais da Europa pelos crimes econômicos e ecológicos. A UE é a que mais se beneficia da devastação do Cerrado através das compras massivas de produtos agrícolas e minerais da região. Modelo que, segundo o TPP, contribui para promover tanto o ecocídio quanto o processo de genocídio dos povos do Cerrado.

Ainda conforme o veredito final do TPP, o Acordo, em trâmite desde 2019, tem sérias limitações como: a proteção apenas de terras que são definidas como “florestas”, deixando desprotegidas grandes áreas do Cerrado, de onde vêm 65% das importações europeias de soja e carne bovina; e não estabelece requisitos para respeitar os direitos humanos, em particular os direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, incluindo o requisito de respeitar os direitos de posse e o direito ao consentimento livre, prévio e informado, previsto pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

“O Acordo UE-Mercosul vai pressionar a demanda pela produção de commodities e aprofundar o atual modelo agroindustrial, baseado no uso de transgênicos e agrotóxicos, nos monocultivos e na concentração fundiária, e voltado para o mercado externo, em detrimento da produção familiar e camponesa e seus sistemas alimentares diversificados”, pontua Maureen Santos, no Dossiê AGRO É FOGO em seu artigo: Acordo UE-Mercosul: combustível da devastação da Amazônia, Cerrado e Pantanal. 

O agronegócio põe fogo no Brasil

O Acordo favorece o agronegócio no Cerrado e ampliará a destruição. E para colaborar nesse argumento, a Entraide et Fraternité também organizou e publicou um estudo a partir de seu intercâmbio realizado em setembro do ano passado em Goiás e em Tocantins, com parceria da Articulação Agro é Fogo e da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

O documento intitulado “O agronegócio põe fogo no Brasil: quando a agroecologia se torna uma arma de resistência” é fruto de reuniões com comunidades camponesas, tradicionais e indígenas, assim como com atores da sociedade civil e da política.

O estudo apresenta questões estruturais relacionadas à violência e conflitos por terra e aos recursos naturais em Brasil; as relações comerciais, pois o Brasil é o maior fornecedor de matérias-primas do mundo e a UE seu segundo maior parceiro comercial; e destaca os papéis de movimentos sociais e ONGs para avançar em políticas e programas em apoio a um modelo alternativo de agricultura, especialmente sobre o avanço das mulheres à frente da luta pela terra.

O documento ressalta alguns dados que nos apresentam o cenário brasileiro e a violência contra os direitos dos povos e comunidades tradicionais. O Brasil é o 3º país mais perigoso para defensoras e defensores dos direitos humanos e ambientais: foram 342 assassinatos de entre 2012 e 2021, quase 20% de tais mortes no mundo inteiro. Entre 1985 e 2019, período que coincide com o surgimento e consolidação da economia do agronegócio brasileiro, 90% do desmatamento no Brasil foi utilizado para abrir pastagens para gado e áreas para monocultura, principalmente de soja. O consumo europeu é parcialmente responsável pelos conflitos no Brasil (apenas 13% da soja enviada para a Europa não é de desmatamento).

A agricultura familiar representa 76,8% das fazendas do Brasil e 67% do emprego rural, mas cobre apenas 23% da terra. No entanto, quase 70% desses alimentos são consumidos pelas brasileiras e brasileiros. Além disso, o estudo apresenta as violações dos direitos humanos e ambientais envolvendo empresas belgas e o papel da UE na exportação de pesticidas tóxicos para a região. Segundo o estudo, a UE exportou 584 milhões de euros de produtos fitofarmacêuticos (agrotóxicos) proibidos na Europa para países do Mercosul em 2018.

Acesse o estudo completo aqui.

Entraide et Fraternité e Articulação Agro é Fogo

Criada em 1961, a Entraide et Fraternité é uma ONG católica que apoia organizações locais na África, América Latina e Caribe e na Ásia. A Entraide et Fraternité trabalha em parceria com estas organizações, numa perspectiva de longo prazo e baseada num diálogo genuíno. No Brasil duas organizações são fortalecidas, a Articulação Agro é Fogo e a Comissão Pastoral da Terra Regional Goiás (CPT Goiás).

A Articulação AGRO é FOGO reúne cerca de 30 movimentos, organizações e pastorais sociais que atuam há décadas na defesa da Amazônia, Cerrado e Pantanal e seus povos e comunidades. Surgiu enquanto articulação como reação aos incêndios florestais que assolaram o Brasil nos últimos dois anos. 

O que move a Articulação é não somente a necessidade de qualificar o debate público, mas, sobretudo, ir além das imagens de satélite e números de desmatamento, trazendo a dimensão do que é vivido no chão da floresta e dos sertões.


Foto em destaque: Quilombo Cocalinho, Parnarama, Maranhão. Foto: Leandro Santos 

Desmatamento e queimadas